Estas três formas de enxergar o trabalho foram tema de estudo de uma psicóloga de Yale chamada Amy Wrzesniewski. O foco da pesquisa de Amy é como as pessoas criam um sentido para o seu trabalho, especialmente em contextos difíceis (por exemplo, ocupações estigmatizadas e trabalho virtual).
Após vários anos e diversas entrevistas com trabalhadores de inúmeras profissões, ela identificou que as pessoas apresentam uma de 3 orientações ao trabalho, isto é, concepções mentais que cada indivíduo possui em relação à atividade profissional:
1) emprego ou empreendimento
As pessoas que se encaixam nesta classificação consideram o seu trabalho como um meio para atingir um determinado fim. Elas trabalham para receber uma remuneração, de forma a sustentar a família, sua vida social, hobbies etc. São normalmente indivíduos que não permitem qualquer interferência do trabalho em sua vida pessoal. Como se pode perceber, são pessoas que não desenvolvem uma conexão com o ambiente e nem com os colegas de trabalho;
2) carreira
Pessoas com uma orientação de carreira tendem mais a privilegiar aspectos como prestígio, status e sucesso. São aqueles profissionais que têm uma atitude focada em conseguir promoções, aumentos de salário e que valorizam o status e o poder de algumas posições hierárquicas;
3) missão
Os indivíduos que se enquadram nesta classificação consideram o seu trabalho como algo integrado à sua própria identidade. Eles veem a sua carreira e o seu trabalho como uma maneira de satisfação pessoal e que explica parte do próprio sentido da sua vida. Sendo assim, como já podemos imaginar, estas são pessoas que possuem uma conexão com o trabalho e com os colegas, tendo bastante satisfação com a vida profissional.
Esta divisão não impede que uma pessoa possa se incluir em duas classificações ao mesmo tempo. Assim, um profissional que seja orientado por uma missão pode também nutrir expectativas por um crescimento de carreira e de todos os benefícios decorrentes.
Um caso interessante da pesquisa da professora e psicóloga Amy W. é sobre funcionários de limpeza de um hospital universitário. Conversando com eles e perguntando sobre o que eles faziam, ela identificou basicamente 2 grupos: um que simplesmente lhe disse qual era o seu job description (descrição de cargo); e outro que lhe comentou que estavam ali para ajudar os pacientes a serem curados.
Este último grupo comentou coisas do tipo: “minha função é assegurar a esterilização e limpeza do ambiente para ajudar na cura dos pacientes”. Apesar de não serem médicos, as pessoas desse grupo se viam como agentes de mudança e influência. Alguns, inclusive, ao notar os sentimentos de alguns pacientes, iniciavam conversas para tranquilizá-los. Outros trocavam os quadros da parede dos quartos na esperança de que isso mudaria o ambiente e facilitaria o tratamento dos pacientes. Quando a professora questionou a razão para trocar os quadros, a pessoa respondeu que, apesar disso não estar em sua descrição de cargo, ela assim o fazia porque ela era assim em sua própria casa.
Eu mesmo lembro de uma aprendiz que trabalhou em uma das empresas por onde passei e que, ao final de cada dia de trabalho, ela arrumava os calendários das mesas das pessoas do escritório, sendo que isso não era esperado dela.
Por outro lado, há empreendedores que alcançam o sucesso financeiro e, nem por isso, têm satisfação pessoal e profissional. Constroem negócios milionários, mas não conseguem esconder que vivem um fardo. Alguns até vendem as empresas achando que irão finalmente ser felizes. Mas esquecem que o ser humano precisa de crescimento. Nós precisamos nos sentir úteis e evoluindo para que tenhamos realização. Esse talvez seja o maior dos fracassos: ter sucesso financeiro e insatisfação pessoal e profissional. Mas isso fica para um outro post!
Ver o trabalho como uma missão pode ser o resultado de uma atitude mental ou do trabalho em si. Assim, trabalhadores infelizes podem encontrar maneiras de se sentir realizados no trabalho e que não envolvam demissão, mudar de emprego ou jogar tudo para o alto a fim de se encontrar. Basta que cada um busque uma concepção mental diferente e mais positiva em relação à sua atividade profissional.
Por favor, não pense que estou dizendo que toda pessoa infeliz no trabalho tem que mudar a sua mentalidade e achar que tudo é lindo e maravilhoso. Há momentos na carreira em que precisamos mudar, seja encontrando outro trabalho e carreira, seja abrindo um negócio próprio etc.
Ocorre, porém, que nós, seres humanos, temos um certo negativismo gravado em nossa mente que nos ajudou a escapar dos predadores num passado longínquo e certamente ainda nos ajuda a sermos mais criteriosos nos dias de hoje. Porém, quando nos entregamos a esse lado negativo, entramos em uma espiral tão nociva que passamos a ver inclusive as coisas boas como ruins.
Uma simples mudança de percepção em relação ao nosso trabalho pode fazer toda a diferença. E com esse ajuste de atitude mental vem também um aumento de desempenho, já que pessoas realizadas tendem a entregar mais resultados. E, assim, cria-se um círculo virtuoso.
Diante disso, será que não vale a pena mudar o conceito de “descrição de cargo” para “descrição de missão”? Essa é uma das propostas defendidas por Shawn Achor, professor de Harvard.
Confesso que, num primeiro momento, a ideia me agradou. Mas, pensando bem, talvez isso caia em descrédito em pouco tempo, pois a mudança que deve acontecer não é de fora para dentro, mas de dentro para fora! Isso precisa ocorrer primeiro dentro do profissional, na sua mente, na sua maneira de pensar, para que seja efetivo e provoque mudanças no mundo externo.
E aí entra o papel do líder, que pode influenciar as pessoas e provocar nelas reflexões importantes sobre esse assunto. Principalmente em se tratando de um líder coach.
Chip Conley, empreendedor do ramo de hotelaria e hospitalidade, contribuindo também para o Airbnb, gosta de dizer aos seus colaboradores: “esqueça o seu cargo atual. Como os nossos clientes descreveriam o seu cargo caso pudessem expressar o impacto que você provoca na vida deles?”.
Certamente, esta pergunta é poderosíssima e pode ser aplicada a qualquer um de nós. Se você não lida com clientes diretamente, mas com o departamento de vendas ou com outra área, considere estes como sendo o seu cliente. Ou leve em consideração o cliente final mesmo. Afinal, o seu trabalho certamente tem um impacto na vida dele.
Sem dúvida que, quando alguém consegue criar essa percepção e atitude mental, as suas tarefas mais triviais e que antes eram insuportáveis passam a ser mais palatáveis e até prazerosas. Você passa a ter uma visão mais ampla e inclusive se dedica mais e com mais satisfação.
E quanto a você? Sente-se preparado para elaborar a sua descrição de missão? E quanto ao seu trabalho? Como você o considera: emprego, carreira ou missão?